segunda-feira, 14 de maio de 2012

aquela piriguete

Confesso ser masoquista. Eu fico lendo blogs que não gosto muito e fazem textos risíveis só para me chocar com as coisas postadas. É uma espécie de hobby. Bem, tem uma coisa em blogs "femininos que falam de comportamento" (e moda, beleza, namoro, etc) que me irrita profundamente. Aqui o "irritar-se" é puramente: adquirir desprezo, nojinho, senso de "que merda é essa que está falando?". É simplesmente uma idéia: homens são melhores em serem melhores amigos.

Junto com essa idéia, temos outras acopladas como mulheres são falsas. O que é simplesmente ridículo.

Mulheres são ensinadas desde crianças que a coisa mais importante sobre a vida delas é um bom casamento e sobre como ter bons maridos. Não importa de que elas façam faculdades, façam intercâmbios, aprendam três línguas - a coisa que será cobradas da gente sempre será um "namorado", "marido" e "um bebê". O papel de esposa e mãe nos manda beijos o tempo todo, e é difícil se esquivar dessa cobrança quando se tem todas as parentes te encarando com seus olhos de urubus. Aí aprendemos que mulheres são falsas, porque não importa o que aconteça, elas sempre vão se trair - por conta de um homem, por conta de um emprego, por conta de maldade pura e simplesmente.

Eu comentei do "tem que ter um homem" porque é uma questão bem comum de se encontrar nos filmes, livros, séries e novelas que abordem duas mulheres e um homem. Mas o que eu quero abordar aqui é: desde quando passamos a achar que mulheres são, de fato, falsas? Quando foi que nós, como mulheres, começamos a achar isso de nós mesmas? Quando foi que nós olhamos a "camaradagem masculina" com inveja, como se homens fossem, de fato, melhores amigos? E ainda mais: quando foi que nós passamos a achar que homens são, de fato, mais sinceros, mais confiáveis, mais camaradas? Porque, sinceramente, eu creio que isso tudo seja uma grande ilusão. Uma mentira propagada pela mídia que acreditamos cem vezes até se tornar verdade.

Acreditei nisso quando eu tinha doze anos. Eu tinha amigos homens e amigas mulheres. E eu realmente internalizei aquilo na minha cabeça de forma a acreditar que as mulheres eram falsas e os homens não, simplesmente porque eu via as menininhas fofocando a respeito uma das outras. Acontece que eu não percebia que meus amigos homens faziam a mesma coisa - e que a minha amiga não fazia. Porque fofoquinha, intriguinha, falsidade não é questão de gênero, apenas de caráter e caráter é tão pessoal quanto seu estômago. Demorei anos para entender que eu fui moldada a acreditar nisso, lendo revistas com garotas felizes com seus amigos homens porque eles eram mais legais e não faziam fofocas, vendo novelas que amigas se matavam para ficar com o galã, assistindo filmes que o homem era infantilizado e livre de sua responsabilidade de trair e então toda a culpa era jogada em cima da amante. Eu internalizei esses conceitos enquanto era criança, aprendendo que eles eram verdade e eu os reproduzia, porque aquilo fazia parte do mundo que eu conhecia.

Até que então você entende que o problema não está nas meninas da sua sala. Está na mídia que faz com que você tenha uma opinião duas vezes pior das meninas da sua sala de aula do que dos meninos. Mas é difícil se desapegar, porque você passa a vida inteira seguindo conceitos contraditórios em relação a você, ao seu gênero e ao papel que você desempenha na sociedade. É difícil olhar para aquela garota da sala que você chamava de piriguete e entender que ela está sendo livre. Que você vivia a julgando, mas esquecia do menino da sua sala que também pega todas - você mal o encara, porque ele está inserido no papel que cabe ao homem na sociedade. É simplesmente uma questão de treinar o olhar: quando você está condenando alguém por alguma atitude, você o está fazendo por aquela atitude? E se fosse o gênero oposto, você ainda o faria? Quando você propaga aos quatro ventos que mulheres são falsas, com base em quê você afirma isso? Você fez um estudo estatístico com uma amostra confiável para saber disso? Ou você está se baseando na sua vida?, e isso dará como inválida a sua constatação, porque, convenhamos, opinião pessoal vem carregada de contextos. 

Tente então sair desse papel. Se uma revista diz a você "seja como os meninos, não seja falsa" (só me lembro de uma matéria da Capricho que ainda comentarei aqui), simplesmente lembre a você mesma que o caráter independe do gênero. Que o fato de ser um menino não significa que ele seja sincero, despojado e divertido. Meninos também sabem mentir, iludir e perseguir. Tente preferir filmes e livros no qual haja valorização da amizade feminina - é tão fácil encontrar amigas verdadeiras na vida real, mas é tão difícil encontrar tais amigas na mídia representadas de forma pura, sem nenhuma competição por homem ou beleza. E, mais importante de tudo, traga para a sua vida esses conceitos: iguale seu olhar e sua opinião. Porque se você acredita que "aquela vadia está roubando seu namorado", é porque você está tirando a responsabilidade de seu namorado e a transferindo para uma garota - e novamente você culpa uma garota por algo que seu namorado lhe deve. Se você acredita que "aquela piriguete da sala está perdendo respeito porque fica com todos", é porque você acredita que o valor de uma pessoa se mede com quantas pessoas ela já foi pra cama - e, convenhamos, você nem tem um critério para especificar esse tipo de coisa. É ridículo, porque você não faz a mesma coisa com garotos. 

Aliás, você nem chega a questionar garotos com o mesmo comportamento.

Então a partir do momento que você iguala o olhar, muitos dos seus julgamentos morais se perdem - simplesmente porque você não os faria com garotos, então não os faz com garotas. Aí você perceberá que como você deixou de julgar outras garotas, acaba deixando de julgar a si mesma - porque entenderá que muito do ódio que talvez sinta por si não é realmente natural. É algo construído - somos criadas para nos odiarmos, nos julgarmos, nos criticarmos. Se você simplesmente abaixa esse julgamento, abaixa também esse ódio - e não só com a sua colega de sala, mas consigo também. E então você terá dado um passo para uma sociedade mais igual.


3 comentários:

Pietra disse...

s2

Mariana =) disse...

Me lembrei de uma ocasião em que estávamos algumas colegas da faculdade e eu conversando sobre amizade. Uma delas solta "mulher é tudo falsa, é fato!", eu estranhei a colocação, afinal nunca tive uma amiga sequer que agisse mal comigo, e falei "eu não acredito nisso, tenho amigas e elas nunca foram falsas". A resposta dela (que até hoje é bordão das outras colegas que presenciaram a situação) foi: "Mas, Mari, você vive em outra realidade". Veja só! Eu só não vejo a falsidade das mulheres porque sou do mundo da lua, belo argumento, hein?
Acredito na amizade entre pessoas, sejam homens ou mulheres. Queria falar mais, quem sabe um dia volte pra complementar a discussão. Adorei ver que alguém pensa como eu. Seu blog é ótimo. Abraços,

Bibs disse...

Me lembrei também de uma amiga minha que postou isso de "mulher é tudo falsa" no facebook uma vez e eu comentei que nunca tinha tido uma amiga que tivesse sido falsa comigo e ela respondeu que eu ~tive sorte~, incrível que a minha vida toda eu sempre tive grande maioria de amigas e um ou outro amigo, então as chances de eu ter trombado uma naja por aí foram altíssimas se isso de "mulher é tudo falsa" fosse verdade. E fiquei me perguntando se essa amiga não é falsa comigo porque vai saber né? mulher é tudo falsa ~rs

Ps:esqueci de falar que seu blog é bem foda! @_@