quinta-feira, 30 de setembro de 2010

jogando o dado para cima

"É a luxúria, nascida dentre a paixão, que se transforma em ira quando insatisfeita. A luxúria é insaciável, e é um grande demônio. Conheça-a como o inimigo."

Eu não sou nem evangélica, nem católica. Não faço parte do cristianismo, não sigo Jesus e desdenho a Bíblia. Não acredito em pecados.
Mas... eu amo os pecados.

A luxúria que nos envolvem em tabus, a ira que nos prendem à vergonha, a avareza que nos fazem menos populares, o orgulho que sempre é ferido, a gula que nos enchem de culpa, a preguiça que nos anestesia e a inveja, essa sempre mortal, que nos enchem com o sentimento de rancor e inferioridade. São os sentimentos mais humanos, comuns e cheios de verdade que encontramos nas pessoas. São simples e corrosivos, são mortais e singelos. São simplesmente pecados que cometemos o tempo todo, que levamos em frente, que amamos e odiamos. Amamos porque eles nos fazem se sentir mais humanos, odiamos porque eles são o contrário da perfeição. O humano tem horror ao imperfeito. Matamos fetos deformados em inúmeras civilizações, temos nojo de cicatrizes, verrugas, deformações físicas e qualquer coisa que ofenda a absoluta perfeição da simetria. Como não exigir o mesmo dos sentimentos? Mas não somos santos.

Somos como as cópias mortais e fajutas dos deuses de Olimpo.

E eu vivo assim, meio que beirando a linha entre o certo e errado, sempre zombando do céu e temendo o inferno, sempre olhando para cima e caindo embaixo. E ora eu peco sem culpa, sem sentir remorsos, com o sorriso de quem ama a liberdade. E ora eu junto as mãos em uma reza silenciosa à mim mesma, lembrando que eu não serei tão invejosa, tão preguiçosa, tão avarenta. Prometo a mim mesma que serei uma pessoa melhor e sempre caio no mesmo erro, como se jogasse um jogo de azar e não aprendesse que a roleta nunca irá parar naquele número. Às vezes me imagino como se estivesse em um cassino, com o batom mais vermelho do mundo, e jogasse os dados para decidir o meu destino. Eu decido qual pecado vou cometer naquele dia. E qual virtude que vou ter para balancear as contas. Então, perdão, não posso escolher um somente: eu sou uma garota pecaminosa. Sou alguém que gostaria de ser rica para simplesmente jogar pratos contra a parede sem me preocupar em pagar a conta depois. Também sou alguém que cobiça a conta bancária alheia. Sou alguém que consegue ser generosa e contar piadas sujas demais para uma dama, que grita com a parede de ódio e abraçar outros. Não posso me encaixar em categorias, porque pertenço a todas elas.

Qual é o limite entre o certo e errado? Qual é o ponto que nos sentimos culpados? Qual é o ponto que passa a ser fanatismo? O que é pecar? É ter três amantes? É ter ódio de alguém o suficiente para desejar parti-la ao meio? É sentir no peito aquela invejazinha da amiga que conseguiu passar no vestibular e você não? É não querer emprestar dinheiro para o seu amigo? Qual é o ponto que a nossa moralidade deixa de ser ética e passa a ser distorcida, patrulha, falso moralismo? Qual é o problema com casais bígamos, contanto que eles sejam felizes? Qual é o desvio moral em gays vivendo juntos e em fetiches realizados em lugares feitos para isso? Eles são tão pecadores que não irão para o Reino dos Céus ainda que sejam bons, honestos e que tenham tratado com respeito todas as pessoas que encontraram no caminho? Uma prostituta merece menos respeito do que eu? Uma freira merece mais respeito que eu? Somos todas iguais perante aos olhos divinos ou não? E quando eu quero tanto ser rica feito Madonna estou pecando tão horrivelmente? Ou todos os meus pecados e minhas virtudes são anotadas e depois, quando eu morrer, será feita uma balança e decidiremos qual é o meu destino? Seria mais fácil jogar um dado para cima.

Se der número par, sou santa, número ímpar, sou pecaminosa. Muito fácil de se decidir.


#Texto feito para a Blorkutando. Há quanto tempo!
E vazei, vou ver o debate!

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Contagem regressiva!

Hoje, depois de uma enrolação tremenda, peguei meu título de eleitor! Isso quer dizer que eu vou votar pela primeira vez na vida, e eu fico tão feliz de votar por opção. É algo que me empolga sinceramente, como se eu fosse uma criancinha. Eu sempre quis votar desde 2002 quando houve Lula x Serra e imediatamente assumi que eu era Lula. Eu só tinha nove anos, mas o simples gosto de ficar estampando adesivos com LULA 13 na pasta do colégio e discutindo com meus colegas que eram Serra era algo que me animava muito. Eu amava - e ainda amo - todas as piadinhas políticas, tipo Marina planta, Serra serra, sabe? São idiotas, mas me animavam muito.

Volta e meia eu falo que era melhor jogar uma bomba na Câmara de Deputados, Senado, Gabinete, tudo junto. Marcaria uma reunião sobre reajuste de salário, todo mundo aparecera, prenderia todo mundo e baubau. Jogava uma bomba a la EUA ou ainda encarnava Osama Bin Laden e fazia um avião cheio de gente que não coube no local se explodir. A imagem na minha cabeça de os políticos pagando o preço de tamanha corrupção é linda. É bem violento, eu sei, mas quando eu estou com raiva de alguma coisa, eu sempre imagino essa cena. É uma solução drástica, dramática e que faria o mundo inteiro ficar em choque. Ultimamente estou é torcendo que Dilma vença e coloque mesmo a ditadura socialista que a Veja e cia tá com medo. Quem sabe, assim, a Veja sabe o que é uma ditadura de verdade (pra quem chama a ditadura militar de revolução de 64...). Mas é só coisa da minha cabeça. Não que eu realmente vá fazer isso. Ou mesmo pularia de alegria se isso acontecesse.
Mas ímpetos homicidas todo mundo tem e eu não sou exceção!

Não sei em quem vou votar.

Estou tentada a votar em Dilma. Mas não tenho certeza. O fato de eu ter totalmente apoiado Lula aos 9 anos de idade não quer dizer nada: de lá pra cá eu consumi uma quantidade absurda de Veja, assumi certo ódio e decepção com o PT durante quatro anos (embora eu nunca admitisse tal coisa.) e ainda que continuasse defendendo Lula na sua reeleição, eu não estava satisfeita com ele. Não consigo ter essa sensação de apoiar cem por cento uma pessoa ou um partido. Eu concordo, apóio candidatos, mas não estou totalmente satisfeita. O PT ter precisado se aliar com Sarney e Collor é uma coisa que me desagrada absurdamente. Não gosto da idéia de Collor no poder, tinha que ser cassado de vez! Como um cara que confisca a poupança de milhares de brasileiros simplesmente volta ao poder? Como é que as pessoas VOTAM nele? Isso é algo que foge da minha compreensão.

E sabe o que está piorando com tudo isso: o preconceito contra nordestino. Cansei de tentar defender minha região: não, nós não somos os culpados pelo Brasil tá na miséria. Não, não somos sugadores do trabalho do Sudeste e Sul. Não, não votamos todos em Collor: somente o estado de Alagoas e ponto final. O Nordeste tem NOVE estados, porque nos julgam pelo erro de UM estado? É como julgar o Brasil inteiro porque 54% tá preferindo Dilma. Não, não queremos viver na mamata, no bem-bom e não, não é por isso que votamos no PT e seus afiliados. É só porque a direita brasileira é uma merda pra gente. PSDB e DEM ferraram com Nordeste durante anos. Na Bahia, era ACM e sua corja de descendentes imundos que permeia todas as eleições e eu quero mais que morra toda a família de vez. Porque essas pessoas acham que os nordestinos querem votar em partidos que simplesmente ferraram com ela? Porque essas pessoas acham que nós gostamos de sermos vistos como retirantes de sotaque forçado made in Globo? Não somos dessa maneira cheia de caricatura como essas pessoas pensam. Eu me recuso a ser inclusa no povo que chamam de alienado, burro e pobretão - como se só o Nordeste fosse assim. Como se também não houvessem alienados, burros e pobres no Sudeste, Norte, Centro-Oeste e Sul. Não somos tão diferentes do Brasil assim.

E que me permitam uma provocação: eu até assumo a culpa de eleger PT. Mas não somos nós que vamos eleger Tiririca, a piada do ano.



E sabe o que é pior dessas palhaçadas? O Brasil todo que paga o pato, como bem atesta o verdadeiro e sincero post de Amanda sobre como a França enxerga nossos candidatos.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

mentiras políticas

Dilma nunca disse nada contra Jesus.
Dilma negociou com evangélicos prometendo que não vai liberar o aborto / ao passo que há provas que afirmam que ela é a favor da legalização.
Dilma não tem uma amante que lhe pede pensão, e ainda que tivesse, ela ser lésbica não é problema nosso.
Dilma não é proibida de entrar nos Estados Unidos.
A ficha policial de Dilma publicada na internet é falsa.
O vice de Dilma não é satanista.

Não adianta, quanto mais as eleições passam, mais os tucanos ficam desesperados e tentam inventar histórias, espalhar correntes que assumem status de verdade, mas são meras mentiras que são desmentidas até mesmo por blogs sérios aliados ao PSDB. Desespero faz mal e envenena a razão.

Não sou petista.
Não sou tucana.
Não sou do PMDB, PSOL, DEM ou qualquer coisa do tipo.

Eu só gostaria que as pessoas mentissem menos, guardassem as armas e fossem capazes de sentar e discutir polícia como pessoas sensatas. Mas parece que quanto mais perto é a eleição, mais o povo fica eriçado, armando dentes e empunhando facas. Argh.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

gente louca, burra, cega e... spammer.

Ontem fiz um post elogiando o documentário Sicko que esculhamba os planos de saúde, acusando-os de financiadores de assassinatos em prol do lucro.

E eis que recebo o seguinte comentário:

"SEJAM BEM VINDOS A MEGANE CONSULTORIA, aqui começa uma parceria de sucesso, porque nós, temos certeza de que vale a pena investir na proteção daqueles que são à base de tudo.

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Centro - São Paulo - SP
Tel. / Fax. 3231-4748
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Exatamente. Recebo propaganda de uma consultoria que vai me oferecer o melhor plano de saúde justamente em um post que os critica. Tem gente que não toma simancol.

À essa amável empresa, digo muito respeitosamente: vá tomar no cu.
Tudo o que tenho a dizer.

domingo, 19 de setembro de 2010

Sou mais o SUS

Ontem eu assisti o documentário Sicko, de Michael Moore. Eu não lembrava quase nada dele, mas enfim, resolvi assistir. E a cada dez minutos que passava, eu ficava cada vez mais chocada. Eu sei que o nosso sistema de saúde não é dos melhores, aliás é bem precário e tudo o mais. Mas, tipo, a gente sabe disso. Nós sabemos que hospitais são falhos, que planos de saúde nos roubam, e brasileiro tem em sua natureza desconfiar de tudo e de todos: sistema de saúde, política militar, exército, presidente. Acreditamos piamente que todos vão nos roubar e que podem passar a perna na gente a qualquer momento. Mesmo assim nos chocamos com o documentário que narrava casos como, digamos, um cara teve as pontas de dois dos seus dedos cortadas e teve que escolher entre restituir o dedo médio (por 12 mil dólares) ou o anular (por 60 mil dólares). Ok, você fica com aquela cara de WTF?

Claro, porque acabamos tendo na cabeça que se a gente acaba tendo um dedo cortado, a gente vai pro hospital, consertam e se preocupam com a conta depois. Não, de acordo com o documentário, não é assim. Eles se preocupam primeiro se você pode pagar aquilo. Sua saúde não é prioridade, e sim os lucros que vão ter. Os planos de saúde que cerca de 250 milhões de americanos tem ainda são sacanas. Para você fazer uma cirurgia de qualquer coisa, um exame de qualquer coisa, comprar remédios de qualquer coisa, tudo, absolutamente tudo tem que ser avaliado pelo seu plano de saúde e é grande a porcentagem de recusas que vão te negar uma ressonância magnética, por exemplo. De acordo com a médica lá que esqueci o nome, qualquer gasto que eles façam é chamado de "perda médica". E ela contou que quando ela recusou algo lá que fez com que a empresa economizasse cinquenta mil dólares, ela foi promovida. Provavelmente a pessoa que recebeu a recusa teve seu problema agravado ou ainda morreu. Mas ela foi promovida.
Médicos que estão matando são promovidos.

O documentário fala também do sistema de saúde de Canadá, França e Inglaterra. Essas são as melhores partes do filme: a cara das pessoas quando elas ouvem sobre o sistema dos EUA. A cara do rapaz que teve todos os cinco dedos cortados e tais foram recosturados e ninguém cobrou dele é impagável quando ele ouve sobre o caso do homem que teve que escolher qual dedo pagava para ter de volta. Ele fica com aquela expressão como se alguém falasse que os pássaros dançam rumba na Espanha. Tipo, MUITO estranho. Ou quando Michael Moore resolve interrogar um homem que teve uma queda de bacia e fraturou algo, e a cirurgia iria custar cerca de 25 mil dólares, então o cara (ele era turista) voltou pro país dele ~ Canadá ~ e fez a cirurgia sem pagar um centavo. E Michael Moore conversou sobre ele e ele disse que o sistema de saúde tinha que ser público, universal, etc. Teve uma parte do diálogo que amei:

- Você não pagou nada?
- Não.
[...]
- Porque você acha que os outros devem pagar por um problema seu? [obviamente o sistema é pago pelos impostos]
- Porque os outros fariam a mesma coisa por nós. [que amor!]
- Você é comunista?
- Não.
- Socialista? Anarquista? Você é do Partido Verde.
- Oh, não. Na verdade, sou do Partido Conservador. Algum problema?
- Oh, não, não rs.

Eu confesso que dei aquela risadinha. Mas só ri mesmo quando Michael foi para Inglaterra conhecer uma farmácia onde todos os remédios são vendidos a dez dólares. Ele começa a tirar sarro, perguntando onde estavam vários itens como cadeiras e telefones, algo do tipo, e o farmacêutico todo sério. No final o farmacêutico diz, como um perfeito soldado inglês, que não estudou tantos anos para vender pneu. ok, contando não é engraçado, mas quando você vê, realmente fica engraçado. Sabe o humor britânico? Desse tipo.

Mas a cena mais tocante é quando ele descobre que na prisão do Guantánamo os presos tem atendimento melhor que ao dado para a população americana, em média. O que ele faz?
Pega todo mundo que entrevistou para fazer o filme e chama todo mundo para ir na prisão para receberem atendimento médico. É óbvio que ninguém sequer pergunta a ele quem é. Tudo o que faz é tocar uma sirene e Michael percebe que é hora de dar o fora. E ele acaba indo parar em Cuba. É, porque a prisão fica em Cuba. Nesse momento me pergunto até onde vai a manipulação. Quero muito acreditar que ele realmente foi lá querendo ajudar os doentes que o acompanhavam e tudo o mais, mas... ele realmente levou cerca de vinte pessoas doentes para o meio da Cuba sem planejamento algum? Parece que sim.
E, surprise!

Em Cuba todo mundo é atendido. Exatamente, o país que todo mundo sabe que é o inferno na terra atendeu a todos os americanos recém-chegados, dando remédios, fazendo exames, tratamento de qualidade. É de partir o coração quando a moça vai comprar um remédio em Cuba e descobre que aquele remédio custa apenas cinco centavos - nos EUA, ela tinha que pagar 120 dólares. Assim como você se emociona quando vê todo o Corpo de Bombeiros homenageando as três pessoas que ajudaram a resgatar vítimas no 11 de Setembro: sim, o governo americano ignorou essas pessoas, mas não o Corpo de Bombeiros cubano que se posicionou perante elees e declararam louvor e admiração à atitude deles. Sim, os heróis americanos foram mais bem tratados em Cuba do que na própria pátria. Eu fiquei pensando bastante no nosso sistema de saúde.

Eu não tenho plano de saúde. Quando eu era criança e a vida financeira de meus pais eram flores e ouros, eu tinha. Por conta da minha deficiência auditiva, eu tive um plano que me deu tudo o que eu precisava. Mas era pequena, eu nem lembro direito de como era. Só sei que tenho um monte de exames. Diz minha irmã que foi como se me virassem do avesso para descobrir tudo ao meu respeito, rs. Atualmente não tenho plano de saúde, como já disse, e quer saber? Não sinto falta. Eu sei que posso usar o SUS a qualquer hora. Não tenho medo de ir para o hospital, mesmo que minha mãe que é técnica de enfermagem veja casos de corrupção e descaso flagrantes. Não tenho medo de depender da saúde pública: já dependi e não morri, nem fui maltratada. Só que sou uma exceção, eu acho. De qualquer modo, acho que se eu chegar no hospital com a perna cortada, os médicos vão é costurar a perna e deixarem a conta pra depois.

Ou será que não?



Clique na imagem ou aqui para baixar o filme legendado.
Não conferi o link, não sei se está funcionando (:

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

pequena reflexão sobre eu e ele



Hoje um garotinho entrou no ônibus, contou qualquer história e pediu dinheiro. Ele pediu de forma tão bonitinha, tão engraçadinha, a coisa mais cuti-cuti. Eu o mandaria direto para protagonizar qualquer história sobre crianças sofridas. Mas ele estava lá, pedindo dinheiro com aquele jeitinho fofo, engraçadinho. Todo mundo achou fofo. E mesmo contrariando meus princípios de não dar dinheiro para crianças, porque quase sempre tem uma pessoa por trás que se beneficia disso, eu dei uma moeda.

Dei a moeda mais dourada que tinha, de vinte e cinco centavos.

Todo riu depois. "Desse jeito, quem não dá?" diz uma mulher. Mas...

Até quando? Não é justo que eu tenha acesso à internet, comida em casa e uma boa educação enquanto crianças estão pedindo dinheiro em ônibus, talvez para pagar vícios delas ou de outras pessoas, talvez para comprar pão e leite. Simplesmente não é justo que tanta gente tenha tão pouco e pouca gente tenha tanto. Me pergunto o quão abriria mão dos meus privilégios para que mais pessoas pudessem viver bem, mas me pergunto primeiramente quais os privilégios que tenho. Tenho o privilégio de estudar numa boa escola, de ter computador e acesso aos livros, revistas, jornais. Tenho o privilégio de não precisar trabalhar.

Porque quando tentamos mudar isso, nos chamam de comunistas? Não vai ser possível nivelar a sociedade por cima: é impossível todos nós termos um padrão de vida que exige demais do planeta. Para todas as pessoas serem igualmente ricas como americanos, é preciso que haja escravidão. Não sou socialista, comunista, anarquista, somente acho que o capitalismo pode e vai falhar a qualquer momento, porque se ele é a base do lucro, então para que alguém realmente lucre, é preciso que alguém perca. Eu não sou a favor disso. Eu não gosto da idéia de que é natural a desigualdade social. Não é.

A seleção natural é, sim, parte da nossa natureza. Os melhores se sobressaem, isso acontece em qualquer lugar. Mas não quer dizer que podemos agir como leões exigindo seu território e criar uma sociedade completamente desigual. Afinal numa selva de verdade dois leões saudáveis tem a mesma chance dada pela natureza. Na nossa selva, a pessoa perde a chance de competir só ao nascer numa família errada em um lugar errado.


terça-feira, 7 de setembro de 2010

O pop que me deu o caminho.

Olha, eu não sei como eu comecei a ser feminista.

Eu só sei que sou. Desde que me entendo por gente, eu sou. Era um comportamento natural, ao meu ver, de mulheres. Eu achava que todas as mulheres eram assim: por quê alguém seria contra a idéia que dava às mulheres o que era de direito delas? Eu entendia os homens: eles eram machistas e grosseiros, e cuspiam no chão. Era nojento, mas eu entendia que eles não queriam ver as mulheres se igualando a eles. Mas na minha cabecinha infantil, todas as mulheres eram feministas. Feministas não, que nem sabia o que significava a palavra. Mas a palavra na minha cabeça dizia a mesma coisa. Assim como todos os negros eram contra o racismo, todos os gays eram contra a homofobia, as mulheres seriam contra o machismo. Minha cabeça funcionava assim. E deveria ser assim, mas demorou muito tempo até eu entender que as mulheres são vítimas e agentes desse machismo e a mesma coisa acontece com negros e gays: a sociedade existe de tal forma que quem vai contra a corrente costuma se sentir muito culpado de ter um pensamento não-corrente.

Mas eu creio que um marco fatal no meu feminismo foi eu assistir um videoclipe. Não lembro quantos anos eu tinha, mas eu lembro que estava na sala e estava passando o canal de videoclipes da Multishow. Eu preferia Multishow porque os clipes passavam legendado (não sei se ainda passam), então eu entendia o que aqueles rappers e Madonna estavam cantando. Foi nessa época que comecei a amar Madonna (e peguei o dia que ela passou o clipe censurado de American Life, que eu amo). E foi quando eu assisti um clipe chamado Can't Hold Us Down. Eu nem sabia quem era Christina Aguilera. Quer dizer, até sabia porque ela tinha sido capa da Capricho, mas nunca tinha ouvido, falar, nada. Eu só sabia que ela era uma cantora que vestia roupas muito sensuais. O termo mais gentil para descrevê-la que as revistas usaram foi "vadia". E ela cantou naquele clipe e a mensagem ficou impregnada.

Sabe quando o mofo pega na roupa e não quer mais sair? Foi exatamente desse jeito.

Passou uma vez, nunca mais vi, deixei para lá. Durante esses anos, esqueci quem era a cantora e o nome da música. Não sabia nada, só que ele era com uma mulher de cabelo preto, boné, top e short que personificavam a indecência em roupa. E era rosa! Mas eu lembrava a letra.

"Então porque eu não deveria ter uma opinião
Eu deveria ficar calada só porque sou uma mulher"

Foram essas duas frases que mais me marcaram. Era só uma música. E embora eu já fosse feminista (mais ou menos, cegamente, sem ter consciência), foi com essa música que já passei a questionar um monte de coisas. Passei a questionar sobre a minha postura que embora acreditasse que mulheres tinham que ter direitos iguais, tal coisa não abrangia os direitos sexuais. Acreditava piamente que menina tinha que se dar ao respeito, que aborto só em estupro, porque a mulher tinha que aguentar as consequências do que fazia, que ninguém mandou ela abrir as pernas. Todos esses clichês de pessoas que tem horror ao feminismo, de pessoas que se dizem feministas, enfim eu acreditava que as mulheres tinham que ser consideradas iguais no trabalho, mas não podiam desonrar o movimento agindo como "vagabundas". E esse clipe, com Christina Aguilera trajada indecentemente, mudou isso completamente. Ele não quebrou de imediato, mas plantou a semente. É por isso que hoje eu sou fã dela: quantas pessoas, com palavras, conseguem mudar conceitos tão arraigados na nossa mente?

Dali em diante, calei minha boca em relação à muitas besteiras que eu dizia. E passei a ser muito, muito mais militante. Nem tanto em relação ao feminismo, mas eu relacionava machismo com homofobia e com total repulsa ao machismo, passei a defender fervorosamente os gays. A defesa era tão veemente que eu creio, na minha antiga escola, que despertava até suspeitas de que eu fosse lésbica (o que seria muito engraçado, mas enfim). A defesa veemente em favor das mulheres veio mais tarde. Por causa de Christina Aguilera e Madonna.

Eu não aceitava quando as pessoas diziam que Madonna estava velha. Que ela era uma múmia, que não fazia música boa, que estava feia, gasta e quem vive de passado é museu. Como assim? Michael Jackson tinha praticamente a mesma idade e ninguém criticava ele por fazer música. Ele estava praticamente uma caveira com todos os problemas que passou na vida, mas ninguém falava mal dele (só da pedofilia, mas isso é outro assunto). E Rolling Stones? Eles continuam lá tocando, cantando, mas quem se atreve a falar mal deles? Mas todos adoram falar de Madonna. Que está velha, gasta, feia, que não presta para dançar, está sem graça, o escambau. E o mesmo veneno corria com Christina Aguilera: que ela era puta, vadia, vagabunda, vulgar. E com Britney, em seus tempos terríveis, tudo foi uma desgraça: ela era drogada, careca, bêbada e estava tendo problemas judiciais. O que eu estava reparando é que as pessoas falavam demais das cantoras. Mas pouco dos cantores. Ninguém se incomoda com homens que queiram cantar até os 80. Mas quando é uma mulher, vestida com shorts e minissaia, namorando um cara com a metade da idade dela, todos se incomodam.

E foi aí que passei a ter consciência do feminismo que eu tinha. Porque eu percebi que se eu queria defender o que eu considerava minhas divas, eu tinha que ter argumentos. E eu encontrei argumentos no feminismo que serviram não só para isso, mas também para tudo que eu fizesse na vida. Nesse ponto entrou o blog EscrevaLolaEscreva e juro que não é porque estou puxando o saco, mas realmente mudou alguns conceitos e fortaleceu outros. É simplesmente porque tinha coisas que eu nunca tinha parado para pensar como cavalheirismo e aborto. Mudei várias idéias minhas novamente, adaptei-as à minha realidade e me tornei uma defensora de mulheres. Acabei indo além do feminismo: passei a defender mulheres. Eu sou totalmente parcial nessa questão: eu sempre vou defender mulheres. Em qualquer caso, sempre vou defendê-las. Eu defendo todas as "putas" que a sociedade abomina, defendo todas as donas-de-casa que querem reconhecimento, defendo todas as moças que querem trabalhar e não casar, defendo as que não querem ter filhos e defendo as que querem ter muitos filhinhos. Defendo as doutoras, professoras e eu, pessoalmente, encaro cada pequena vitória como pessoal. E eu tento passar isso para minha prima. Apesar de ela crescer na moda, nesse meio que eu acho que estão sexualizando demais a criança com sapatinhos de salto e coisas do tipo, eu tento passar o meu feminismo para ela. E eu fico feliz que dá resultado. Eu fico feliz ver que tem pessoas que mudaram seus conceitos sobre Christina Aguilera quando eu passei a apontar a hipocrisia da sociedade que mal repara na voz dela, e na mensagem que ela passa, e sim nas roupas que ela usa. E eu fico feliz de perceber que o feminismo é a corrente que encontrei para minha vida, mais forte do que qualquer outra. Porque o feminismo defende a igualdade entre gêneros, e eu tenho o sonho de ver o dia que as mulheres não recebam mais a culpa por serem estupradas.

Mas às vezes sempre me pergunto se vai adiantar. Só que eu tenho que acreditar que vai adiantar, que toda a nossa luta irá em frente. Por que se as feministas não defenderem e apoiarem a mulher, quem vai ajudá-las?



Post feito aos 46:00 do segundo tempo para o concurso A Origem do Meu Feminismo, do blog Escreva, Lola, Escreva. Fiz às pressas porque passei esses dias envolvida com uma prova, com a Olímpiada de História e com a letargia mental que me fazia adiar tudo que tinha que fazer, como postar no blog! Espero que me entendam...