sábado, 16 de junho de 2012

queridos professores,

Na minha escola, alguns professores resolveram que um grupo de e-mails era um ótimo lugar para vomitarem alguns lixos humanos, como homofobia, racismo, xenofobia, etc. Eu ainda estou achando incrível que pessoas consigam demonstrar seu racismo de forma tão clara em um país que isso dá cadeia, e ainda mais incrível pessoas odiarem nordestinos sendo que vivem na Bahia entre baianos e, provavelmente, são nordestinos também. Além de ser surpreendente que alguém consiga ser homofóbico em uma escola como a minha, mas talvez seja só o meu círculo social que seja muito gay-friendly.

Não vou dizer que me surpreendo com o fato de serem professores, porque aprendi há muito tempo que professores tendem a ser tão irresponsáveis, incoerentes, preconceituosos e nojentos quanto o resto da humanidade. Uma licenciatura devia ensiná-los a lidar com pessoas e a diversidade entre eles, mas não é algo que parece acontecer. Então quando soubemos que um grupo estava sendo infectado com comentários dessas agradáveis pessoas que cruzam nosso caminho, sinto dizer que não me choquei com isso. Já vi pessoas falarem coisas tão horríveis na internet que ainda prefiro, em algum ponto da minha mente querendo se proteger, que elas realmente não pensam isso, só estão com raiva e ódio e verbalizando coisas que não diriam. Lamento dizer que sempre percebo estar errada. Essas pessoas realmente pensam assim.

Essas pessoas, de quem ainda não sabemos os nomes, são os nossos professores. Elas estão lá na nossa frente nos ensinando coisas, sendo admiradas ou odiadas. Elas deveriam ser o nosso exemplo, mas não são. Elas lidam com jovens o dia inteiro. Elas estão na Bahia, elas estão entre negros, elas estão entre gays, elas estão entre mulheres e, no entanto, sentem-se no direito de destilarem todo seu ódio para com tais classes - pelo que sabemos, só as mulheres escaparam dos ataques, mas eu reconheço a linha de raciocínio. É fácil pensar de onde vem a homofobia. É fácil concluir que eles se acham prejudicados simplesmente porque são homens, brancos, heterossexuais, cissexuais, classe média. Se sentem alvejados porque estamos aqui, exigindo nossos direitos enquanto cidadãos.

E eles são professores de uma instituição federal. É tão vergonhoso ter que fazer um Ato Público reunindo pessoas de diversos movimentos sociais porque professores de institutos federais estão sendo babacas. É tão ridículo que alunos que se choquem com seus professores, que alunos simplesmente tenham que se perguntar sobre o quão bom pode ser um professor se ele nos odiará se formos gays ou negros. Quando alunos destilam seu ódio e envenenam relações, professores podem chamar os pais, fazer trabalhos sociais, conscientizar turmas com vídeos e livros.

Mas e quando é um professor? O que a gente faz?

Sabe, e essa é a parte mais assustadora. Nós vemos pessoas odiando gratuitamente outras pessoas na internet. Eu, como atéia, vejo diariamente pessoas odiando ateus só por serem ateus em diversas páginas da internet. Eu sinto cada ofensa diretamente à mim, porque estão falando de mim. Elas falam do quão eu sou horrível, sem coração, e desejam que eu sofra um acidente e quase morrer para conhecer deus. E como mulher, eu também vejo ódio. Homens se sentindo ameaçados, homens que dizem que todas as mulheres são interesseiras, que são vadias, que são burras e estúpidas. Sou constantemente atacada pela mídia por ser atéia e mulher. E então tem toda a homofobia que me sinto pessoalmente atingida, ainda que preencha "heterossexual" em uma ficha, e tem todo racismo porque eu sei que não sou toda branca e algumas das críticas racistas me atingem também, e ainda tem toda a xenofobia - nasci no Rio, mas vivi a vida toda na Bahia. Em suma, eu reúno tantas características que me fazem sentir cada um desses preconceitos de forma muito pessoal. Quando pessoas estão odiando gays, mulheres, negros, nordestinos, ateus ou qualquer outro grupo de pessoas, eu sinto que elas me odeiam.

Mas você nunca pensa que essas pessoas existem. É como se a gente pensasse que elas vivem nas ruas com um "EU ODEIO GAYS" enorme estampado na testa, como se pudessémos claramente distinguir quem são nossos amigos e nossos inimigos. Mas não dá. Eles são professores. São os NOSSOS professores e eles estão lá, dando aulas, mas quando chegam em casa, eles nos odeiam tão profundamente que é difícil de imaginar. É tão difícil associar o comportamento de um nickname na internet ao da pessoa real, por trás daquele nickname. É tão difícil perceber que mesmo pessoas que parecem amigáveis, "gente boa", carismáticas possam odiar tanto. Eu gostaria de imaginá-los como lobos em pele de cordeiros, mas não é isso que são. Queria poder conseguir pensar que basta educá-los. Que são legais, que é só a sociedade doente.

Mas não dá.

Porque, de fato, a sociedade é doente. Mas essas pessoas já estão envenenadas. Elas estão simplesmente destilando veneno porque não há organismo suficiente para tanto ódio, tanta falta de empatia, tanta maldade. E eu penso nesses professores como pessoas sem rostos, porque eu só sei de um ou outro nome, mas não tenho certeza. Só sinto que elas estão perto de mim, rodeando a mesma escola em que estudo, ensinando coisas que eu não sei. Me pergunto se elas sabem sobre mim. Se essas pessoas sabem que eu as odiaria se eu soubesse sobre o histórico de sites que elas visitam, e então eu percebo que eu não deveria odiá-las de volta. Mas é impossível. E essa é a parte mais triste. Eu só consigo torcer para que outro grupo de professores consiga o que quer. Só espero, sinceramente, para que a escola inteira saiba dos envolvidos e ainda que seja doloroso caso um deles seja alguém que eu goste muito, eu ainda terei esperanças de que eles possam mudar. Porque se essas pessoas que odeiam tanto não mudarem, vai ser difícil coexistir.

Não é necessário, porém, que elas deixem de nos odiar. Só é necessário que elas aprendam que eu ocupo o mesmo espaço que elas, e eu - assim como outras pessoas - não permitirei que elas nos insultem como bem entenderem, achando estarem impunes. É difícil, eu sei, mas se a sociedade brasileira está doente, tudo o que nos resta é tirar o veneno. Talvez espremendo o organismo, talvez injetando sangue novo, talvez matando de vez. Mas só quando deixarmos de nos envenenar, é que poderemos ter uma vida saudável, com pessoas saudáveis ao nosso redor.

Um comentário:

Natália disse...

Como você disse, Luna, não sei por que ainda me surpreendo ao ver que existem pessoas tão... Não sei nem como descrevê-las. Repugnantes, acho.

E hipócritas, por serem professores, profissionais que deveriam supostamente ensinar valores, mas distribuindo ódios e preconceitos gratuitos por aí.

Isso me enoja, de verdade.